Singral Cimeiro - Campelo (Figueiró dos Vinhos) -Coordenadas: 40.04141/-8.23801 Altitude 673 Mts. -Com estação de Radioamador - Indicativo : CT1EIU

terça-feira, 28 de março de 2006

Mais elementos para a história de Singral Cimeiro

POR SINGRAL CIMEIRO

Nos números 78, 80 e 81 deste Jornal, respectivamente de Julho, Setembro e Outubro de 1988, secção “ Notícias de Campelo”, escrevemos nós que é no período de Julho a Setembro que na região melhor se pode desfrutar – no convívio e amizade das pessoas que sobretudo por essa altura lá vão passar férias – da calma e paz de espírito que todos queremos e muito apreciamos.
No número 78, convidámos então os naturais da região, e muito especialmente aqueles que nem mesmo em tais meses lá pudessem ir estar, a acompanharem-nos na visita, por lá, às aldeias, visita, aliás, que foi feita em versos e assim em estilo de algum modo poético e em jeito de também convidar o Turismo a ir lá fazer das suas, aparecendo e promovendo também lá os seus fins...
Indo daquela forma poética de povoação em povoação, quisemos nós ainda cantar uma vez mais a região, as suas aldeias, os seus templos de há séculos com as suas festividades religiosas e seus padroeiros; cantar as suas belezas naturais de que são espelho bem visível os seus outeiros, montes e vales povoados de urze, mato, eucaliptos, pinhais e outro exuberante arvoredo e, por sobre toda esta realidade, o seu céu azul durante o dia e divinamente luminoso e estrelado durante a noite; cantar os seus ares puros e lavados, as suas nascentes de água fresca e cristalinae, de todas elas, o seu "Nilo" ou Ribeira de Alge que, no seu rumerojar sem fim, segue a lançar-se no Zêzere e também na sua passagem a fazer trabalhar as seculares azenhas que ainda restam e encontra no seu percurso; cantar o ali maravilhoso romper da aurora e o pôr-do-sol, rubro em flor, o matinal canto da cotovia, do rouxinol, do melro e de outros alados; e, enfim, recordar pessoas e famílias da mais notáveis da região...
Quisemos tudo isto. E, leitor amigo, certamente se recorda de termos indicado a dita "viagem" na forma poética que vai seguir-se.
Descendo a serra, p'ra cá
Do Trevim, lá na Lousã,
Divagando sem ir lá...
Tudo corri com afã.

Que beleza tu encerras!
Teus braços de água estendes,
Regando bem essas terras
Com zelo que tu entendes...

Descem montes e quebradas,
Imergindo em arvoredo
Aldeias, quase encantadas,
Que me deixam mudo e quedo.

Lá no cimo alcandorado,
Mostra-se outro painel:
È Singral, bem moldurado,
Como esculpido a cinzel.

Pois bem. Nesta última quadra é bem nítido e compreensível que nos estamos a referir à povoação de Singral Cimeiro. Para que bem se saiba onde ela fica, vamos indicar a sua posição no respectivo contexto goegráfico e aind falar dela mais pormenorizadamente.
O Singral Cimeiro é a última povoação do limite norte da área administartiva da freguesia de Campelo. Dista ali, por estrada de terra batida para o trânsito de pessoas e veículos, uns quatro quilómetros da estrada da catraia ( a que passa lá da Lousã para Castanheira de Pêra), e está com idêntico piso de estrada a igual distância, para sul, da povoação de Alge.
Dista assim cerca de sete quilómetros de Campelo. E a corta-mato, isto é, por caminho de trilho através de montes e vales, fica a uns oito quilómetros de Castanheira de Pêra.
A povoação é de origem muito antiga, pois a sua fundação data de tempos imemoriaias. Emoldurada em floresta de eucaliptos e pinhais, ela ergue-se encosta acima a partir d epouca distância do sulco do vale que lhe serve de fundo. É por este vale abaixo que segue a Ribeira do Singral, curso de água permanente que nasce ali à ilharga da povoação no sítio chamado «Porto Espinho». Banha a povoação de Searas e vai desaguar na Ribeira de Alge, ao fundo da povoação deste nome.
Há ainda na Ribeira do Singral - dizem - belíssimas trutas. A explicação disto tem-se no facto de as suas águas não estarem poluídas e as margens da ribeira estarem povoadas de silvados que impedem que se vá a ela pescar e que servem assim de protecção às trutas...
Ao cimo da povoação, já perto dodorso ali da serra, pela qual segue a aludida estrada da Catraia a Alge, fica a capela de que S. Tiago é o padroeiro. Trata-se de um pequeno templo, muito antigo, de cuja construção não há memória.
Há no entanto notícia segura do passado menos remoto, menos antigo, de Singral Cimeiro. Pertenceu, bem como toda a sua região de Campelo, aos condes de Miranda do Corvo, e então chamavam-lhe «Casal do Singral». Pagava foro (tributo ou pensão pela posse e domínio útil da terra) àqueles condes. Supõe-se que foi à praça e passou à posse e domínio dos seus habitantes por volta dos anos de 1834, em consequência do triunfo e fortalecimento do liberalismo que também conduziu à abolição dos direitos de privilégio e herdade dos então senhores nobres.
Temos assim descrita, ainda que sumariamente, uma povoação antiga que parece existir perdida em plena montanha, mas nunca até agora ignorada ou simplesmente esquecida pelos seus naturais, pelos que nela pela primeira vez viram a luz do dia.
Efectivamente, muito especialmente para eles, seus naturais, o Singral Cimeiro é um lugar que dá saúde, vigor de espírito e tranquilidade de alma. Por isso, as transformações de progresso que eles próprios ali têm levado e promovido.
Talvez também crentes de que não há verdadeira paz de espírito e felicidade sem Deus, restauraram interiormente a capela verdadeiramente a preceito. No adro da mesma, e de forma a adequadamente protegê-lo, fizeram construir um muro e aí predomina o frondoso cedro à sombra do qual há bancos e mesa onde fazem retiro e convívio. Em regra, a festa em honra de S. Tiago tem ali lugar no último domingo do mês de Julho.
Após a festa religiosa, tem lugar a festa civil, abrilhantada por conjunto musical e grupo de gaiteiros. Por alturas da festa e meses de Verão, o Singral enche-se dos seus naturais e ali permanecem umas trinta pessoas. Todos são extraordinários na dedicação à terra que lhes foi berço.
Já desde há anos que o Singral Cimeiro reúne, se pode dizer pela mão dos seus naturais, boas condições para cada qual se sentir ali bem a passar férias. Com efeito, dese há uns dez anos que o Singral tem luz eléctrica. Há também telefone e piscina na bonita vivendo do Sr. Mário Lourenço.
Na povoação, também há abundante água em três chafarizes. O precioso líquido vem para ali de cerca de três quilómetros de distância, pois é captado no sítio do Porto Batisqueiros, à Catraia. A vinda da água para lá aconteceu há uns dezoito anos. Na altura, o Singral deu, em troca dela, certa área de terreno ao Sr. Manuel Carvalho, do Coentral, estabelecido com fábrica de alcatifas, tendo então ido ter com ele, para essa finalidade, o sr. Raul Alves, negociante de tecidos de fazenda.
Entretanto, e além destes referidos progressos, o Singral Cimeiro alindou-se. Dum modo geral os seus naturais têm conseguido melhorar e modernizar as suas casas ali. A povoação tem já bonitas vivendas, dotadas de todas as comodidades e, dentre elas, as dos senhores: Mário Lourenço, José Covas, Mário Pestanas, Américo Dias, Vitor Rosas, Américo Simões, Manuel Garola, Alfredo Lourenço e herdeiros de António Rodrigues dos Santos e Sr. Camilo Rodrigues Ferreira.
Além disso, a povoação está dotada de ruas cimentadas e limpas, melhoramento este para o qual os seus naturais contribuíram com duzentos contos, entregues à Junta de Freguesia de Campelo.
Como antes dissemos, o Singral, apesar de em plena montanha, é já uma povoação para se viver e passar férias, graças à exemplar e extraordinária enteajuda e sadia vontade e real determinação dos seus naturais.
Isto nos leva a concluir que, quem vive acordado no bem, sempre tem assim sonhos bons e faz bom trabalho... Mas para quando, ainda, a construção de estrada em devidas condições e para durar e trânsito de pessoas e veículos automóveis de Singral até Alge?!... e cuja falta é apontada como sobretudo a razão de ser do despovoamento ali dos seus naturais...

In "Jornal de Figueiró dos Vinhos", nº 91 de Agosto de 1989




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